O debate em torno das demissões sem justa causa
Por Dhyego Pontes Cunha via Linkedin
Em tempos recentes, tem-se visto, com certa regularidade, notícias e comunicados relacionados a demissões em massa realizadas por diversas empresas no mundo todo – boa parte delas, entende-se, motivada por redução de custos por parte das organizações, em contexto de crise financeira pós-pandemia.
Paralelamente, nas últimas semanas, debates relacionados à demissão sem justa causa entraram nos holofotes no ambiente jurídico, gerando diferentes análises sobre o assunto em questão. Isso porque se espera que o Supremo Tribunal Federal (STF) retome ainda no primeiro semestre de 2023 um processo em trâmite na Corte há mais de 25 anos e que pode afetar a dispensa de trabalhadores sem justa causa no Brasil.
O tema está incluso na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1625, a qual questiona um decreto assinado em 1996 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, que suspendia a adesão do Brasil à Convenção 158, elaborada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e que estabelece limites às demissões sem justa causa.
Do que se trata a Convenção 158?
O artigo 4º da Convenção 158 da OIT determina que “um trabalhador não deverá ser despedido sem que exista um motivo válido de despedimento relacionado com a aptidão ou com o comportamento do trabalhador, ou baseado nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço".
Trata-se de uma norma do Direito Internacional que tem como objetivo regulamentar o fim de uma relação de trabalho iniciada por parte do empregador. Não se trata, portanto, de uma norma proibitiva, mas que exige uma fundamentação que baseie a dispensa de um trabalhador, de modo que cada país estabeleça – baseado, claro, em sua legislação interna – os procedimentos necessários para o ato.
Vale ressaltar que convenções internacionais não são autoaplicáveis e não é da competência da OIT legislar sobre essa questão diretamente nos países-membros.
Impacto indireto
É possível constatar, portanto, que não se trata de um julgamento sobre os impactos da Convenção em questão ou a própria proibição destes tipos de demissão, mas, sim, sobre a constitucionalidade do Decreto editado em 1996 – realizado sem a aprovação do Congresso. Entende-se, inclusive, que no caso de o tribunal invalidar o documento, não haverá um efeito imediato sobre a prática.
Em um eventual entendimento de inconstitucionalidade – que resultaria na volta do Brasil como signatário da Convenção e na necessidade de uma proposta que discuta o tema –, as empresas teriam de justificar as demissões realizadas, de forma que as dispensas sejam “não arbitrárias”.
Em situações de demissão arbitrária, caberia, dessa forma, a elaboração de uma Lei Federal – com edição do Congresso Nacional – que discipline sobre as punições possíveis, pois atualmente não há nenhuma punição prevista na legislação nacional, sendo o único possível impacto, o ingresso de diversas ações trabalhistas solicitando reintegração de inúmeros trabalhadores dispensados sem uma justa causa nos últimos anos. No entanto, cabe destacarmos que, provavelmente, o Supremo Tribunal Federal, caso entenda pela inconstitucionalidade do decreto de 1996, deve modular os efeitos da decisão, ou seja, impor um limite temporal para a eficácia da decisão, o que traria segurança jurídica a esfera trabalhista no país no que tange as dispensas sem justa causa ocorridas nos últimos anos. Boa parte das discussões relacionadas ao tema, portanto, devem ganhar novos tons que facilitem o entendimento sobre o que está em jogo, tanto para os empregados quanto para os empregadores.
Contudo, mesmo que se trate de um assunto cuja resolução pode se estender pelos próximos anos, é importante que as organizações estejam por dentro da discussão, de forma a entender como eventuais resoluções podem trazer impactos para o seu negócio – em termos financeiros e, principalmente, jurídicos.
Nesse cenário, pode ser de grande valor o suporte de profissionais especializados com capacidade de apoiar as empresas diante de dúvidas na esfera jurídica, sobretudo por se tratar de um debate que, caso avance, trará novos elementos para as relações trabalhistas no país.
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